Afinal, somos todos terráqueos

Em Cotidiano por Jonathan Maia

Voo de Fortaleza pra Brasília, início de 2023. Senta ao meu lado uma moça entre seus 17 e 18 anos. Lendo meu Kindle, percebo-a agitada, se mexendo bastante na cadeira, mas não dou muita bola e continuo minha leitura.

Uma senhora do outro lado do corredor, com um olhar clínico que só a experiência trazida pela idade pode conferir, puxa papo com a moça e pergunta: você está com medo? A resposta foi imediata, sem pestanejar: morrendo de medo, eu tenho pânico de voar.

Aquela senhora, como uma mãe, começou a contar várias de suas experiências de voo pelo mundo durante a sua vida, bem vivida, e perguntou: você quer que eu segure a sua mão? Deu a mão pra moça, totalmente desconhecida, durante toda a decolagem, ainda destacando: está tudo bem, somos todos terráqueos.

Tendo ouvido a história, puxei papo do outro lado, e quando a moça não estava conversando comigo, estava conversando com a senhora, entre turbulências e lágrimas.

Descobri que ela estava no comecinho de engenharia aeronáutica, pasmem, e pude compartilhar um pouquinho que aprendi sobre aviação na minha fase de aeromodelismo. Via os olhos dela brilhando quando eu explicava o funcionamento de alguns componentes da asa do avião.

Ela dizia: eu tenho pânico de voar, é irracional, não sei explicar a causa, faço acompanhamento, mas mesmo com medo, encaro o avião.

Conversamos sobre os mais diversos temas, e em determinado momento, já que falávamos constantemente sobre medos, também pude falar sobre alguns dos meus, e como faço para encará-los. Dei uma única certeza pra ela: medos, todos têm os seus, alguns apenas sabem disfarçar melhor.

Sabe aquele professor altivo e autoritário? Sabe aquele empresário ousado e intrépido? Sabe aquele gestor ou executivo implacável? Pois bem, com os óculos corretos, tão precisos quanto os da senhorinha que visualizou o medo no ar, podemos enxergar nessas pessoas também seus temores e medos. Afinal, somos todos terráqueos. Eles só não tem coragem de pedir a mão pra alguém.

Finalizado o voo, a senhora de cabelos brancos se despede. A mocinha também, feliz por ter vencido seus medos. E eu vivi uma experiência nova nessa jornada da vida. Certamente quero os óculos daquela senhora. E certamente quero a coragem daquela moça de pedir a mão de alguém quando necessário.

Foto registrada por mim, no Tribunal Superior do Trabalho.

Deixe uma resposta